o jornal perigoso [chegou tarde e eu nem estava à espera]

















Sexta-feira à tarde. A campaínha toca. É a minha mãe. Veio com sopa para o jantar e as últimas roupas da Alice que tem ajudado a lavar. Mas veio com um sorriso especial. Veio cheia de vontade de me ver reagir. Veio com um jornal perigoso. Aquele que fez esperar milhões e que fez desesperar aqueles que chegaram tarde à fila. O meu chegou 10 dias depois, mas eu não esperei nem desesperei. Mas desejei! E ela não sabia disso. Não sabia, mas adivinhou. Ou já me conhece. Sabe que sou de pormenores, que gosto de colecões especiais. Sabe que quererei guardar esta homenagem para sempre. Sabe que vou ler tudo mesmo que tenha de recorrer ao dicionário francês. E tive de o fazer algumas vezes. Uma delas, fui à procura da palavra "épargnée". Sabem porquê? Porque descobri que neste jornal perigoso morava um cão. Uma cocker que se chama Lila e que não percebe o porquê de todas as quartas-feira se juntarem tantos numa redação tão calma. No dia 7 de janeiro foi assim. Recebeu mais festas e teria direito a bolo de aniversário, não fossem os intrusos. Mas Lila a été épargnée. Ela foi poupada. A Lila continua a ser Charlie! Acho que como não fala e não pega no lápis para desenhar ou escrever não foi preciso se preocuparem com ela. Não sei se terá ido para a redaçao do "Libération". Não sei se andará mais triste. Não sei se continuará sorridente tal como a redação deste jornal perigoso faz questão de continuar. Sei que deve andar a estanhar as quartas-feira, mas continuará a viver. Tal como nós. E sei que continuará sem escrever nem desenhar. Tal como parte de nós. Sabem, não é à toa que gosto de colecionar homenagens. Volto sempre aos meus arquivos. E nesse dia, voltarei a saber que é preciso agarrar no lápis. 

Comentários

Mensagens populares