a minha professora primária e os meus guiões

A minha professora primária chama-se Conceição. Todos os períodos, durante quatro anos, ela dava-me uma folha que começava sempre da mesma maneira: “A Célia é uma aluna assídua e tem bom comportamento”. Foi a minha mãe que me explicou a palavra "assídua", mas também a ação. Para a minha mãe a assiduidade sempre foi fundamental. Nem na faculdade ela gostava que eu faltasse. Mas voltando à minha professora primária, ela pedia-me para fazer recados. Na minha infância as crianças andavam sozinhas e eu ia ao centro comercial Pierrô comprar cadernos ou canetas. Ficava do outro lado de uma estrada movimentada, mas nós não sentíamos o perigo. Também costumava ir à mercearia, logo ali ao lado, com a moeda que a minha mãe me deixava para comprar o bolicao para o lanche. Nessas alturas, eu, o Micael, o Ricardo e a Canocha aproveitávamos para tocar às campainhas do prédio ou andar de elevador. A minha professora primária pedia-me para a ajudar a corrigir os trabalhos, a mim e à Sara. Cada uma corrigia uma fila. A minha professora primária mandava sempre muitos trabalhos de casa. As tabuadas e o alfabeto já estavam mecanizados e somavam-se aos novos exercícios diários. Eu, o Paulo Jorge e a Andreia Susana nunca tínhamos tempo para brincar no Guia da Criança, onde íamos depois da escola. Já os alunos da professora Mariana eram uns sortudos. Nós saíamos quase sempre diretos para a carrinha que nos levava a casa.
 
A minha professora primária batia quando nos portávamos mal ou quando alguém errava muita matéria. A professora Mariana não! Um dia, a minha professora primária deu-me uma reguada na mão. Ela tinha uma vara de madeira e apontava com ela para o quadro. Eu quis ter uma igual em casa e brincava às professoras. A minha professora primária encontrava-me na praça quando ia com a minha mãe aos fins de semana. A minha professora primária não me deixava ler banda desenhada, porque o português vinha do Brasil, mas eu divertia-me com a Turma da Mónica. A minha professora primária gostava muito que fizéssemos composições. E eu também. Adorava preencher páginas e páginas de texto. Uma vez escrevi que quando fosse grande seria jornalista. O que eu não sabia, na altura, é que o jornalismo me faria voltar às composições. A minha professora primária deveria gostar de saber que hoje continuo a preencher páginas e páginas. Gostava de lhe dar um dos meus guiões para corrigir com a caneta vermelha bic. Tenho de voltar mais vezes à praça com a minha mãe! Pode ser que encontre a professora Conceição e lhe agradeça por me ter mandado tantos trabalhos de casa.

Comentários

  1. Também tenho aventuras no centro comercial Pierrô!! ;)

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  2. Que viagem pela memory lane :) Vivam as composições! A minha professora primária chamava-se Celeste e eu adorava-a. Era uma avó emprestada que tinha na escola, que até arrancava os dentes que estavam a abanar! Saudades.
    Um beijo, querida!

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  3. Gostei muito! Fez-me voltar à minha escola primária e à minha professora São. Exigente, dava-nos carolos e estalos na cara. Uma vez, deu-me um e fiquei muito zangada com ela. Depois passou-me, porque gostava demasiado dela para ficar zangada para sempre. Também nos mandava muitos trabalhos de casa. Um dia, já adulta, via-a e não consegui controlar as lágrimas. Sinto que, carolos à parte, que hoje condeno, lhe devo muito do que sou hoje.

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  4. a verdade é que, melhores ou piores, ELAS marcam e sentimos que deixaram qualquer coisa em nós. e isso é BOM. Obrigada pelos comentários :)

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