na minha rua

"Na minha rua". Lembram-se de dizer isto? Na minha rua cada casa tinha uma criança e um adolescente. Hoje, essa minha rua continua com muito pouco trânsito mas antes tinha muito mais movimento. Era o nosso ponto de encontro. Naquela altura quem chegava a casa queria rapidamente sair. Na minha rua quase não havia brinquedos nem televisão e desconhecíamos os telemóveis. Nada disso era preciso. Éramos criativos. Saltávamos das varandas para os montes de areia das casas ainda em construção.  Inventávamos mercearias com pedras e afins. Escrevíamos com o giz no chão. Foi na minha rua que tentei andar de skate quando estava na moda. Os mais velhos construíram uma rampa na nova urbanização e eu queria ser como eles. Ganhei um skate cor de rosa, mas rapidamente desisti. Na minha rua faziam-se guerras com tubos de plástico e cartuchos de papel. Na minha rua ainda mora a mesma drogaria. Foi lá que arranjámos uma fechadura para proteger a cabana que construímos em cima da árvore. Na minha rua as noites de verão eram muito quentes. Não havia muito barulho. Só o nosso e o das nossas mães quando gritavam para irmos para casa.  Na minha rua eu tinha os meus ídolos. Adolescentes que venerava e que queria repetir. Foi lá que passei da fase das brincadeiras para o momento em que bastava ficarmos sentados no passeio a conversar. Na minha rua lanchávamos na casa mais próxima. Dávamos as boas vindas aos novos vizinhos. Hoje, a rua já na é minha. Perdeu os miúdos e os adolescentes. Ficaram os pais. Alguns, orgulhosamente com os netos, mas esses raramente se encontram na rua. Hoje, tenho uma nova morada onde habitam poucas casas, mas mesmo assim ouvem-se algumas crianças. Nesta nova morada passam muito mais carros, mas há também muito mais terrenos vazios. Há árvores. Há espaço para a liberdade. Um dia, gostaria que a minha filha me pedisse para ir para a rua. Mas gostaria ainda mais de lhe conseguir dizer que SIM. Serei capaz?
 

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