sempre gostei do meu dia de anos.
















 


















Sempre gostei do meu dia de anos. Sempre. Sempre desejei que chegasse. Ano após ano. Nunca liguei à idade. Nunca me preocupei com os anos que passam. Nunca senti borboletas na barriga na contagem para a maioridade. Nunca senti o peso dos trinta. Acho que nunca contei as velas. Acho que sempre gostei dos aplausos. Das pessoas. Das surpresas. Dos afetos. Lá em casa sempre foi especial. Sempre foi um dia de acrescento. Ser acordada pela manhã com três parabéns que pareciam mil. A caixa de papelão dos padrinhos que vinha de França. Cheia de mimos. A prenda dos pais. Porque as prendas só existiam três vezes por ano. Eu esperava pelo natal, pelo aniversário, e pelo dia da criança. Às vezes uma ida ao Pão de Açúcar trazia brinde. Mas era raro. Depois, eram as chamadas. De perto e de longe. Normalmente ninguém se esquecia. Era o dia de anos da avó. Mas eram também os postais. E na primária, era o dia em que eu mandava. Quem escolhia as brincadeiras era a aniversariante. Coitadas das que faziam anos no Verão, como a Patrícia. Era dia de roupa nova. Ainda me lembro do fato de treino roxo, numa terça-feira de teste de ciências. O pior dia de aniversário. O sistema circulatório. E um teste anulado. Uma professora rude. Um dia ela disse à minha turma que só o Hugo Valério teria futuro. Mas esse dia de anos fez-me arrebitar. Olhei para a escola com outros olhos. Percebi o valor. Doeu. Fui para casa triste. Com medo. A chorar. Era injusto. Mas em casa os pais souberam abraçar. Acreditaram. E fizeram-me acreditar e ter força. Foi o único dia mau. Mas passou. E eu tirei o melhor dele. Mas dizia eu, eram as roupas novas. Sempre fui vaidosa. Nos anos comprava-se uma peça de marca. Na adolescência. Umas calças Levis em saldo ou umas Doc Martens. Era assim lá em casa. Tínhamos de dar valor às coisas. Lembro-me, como se fosse hoje, da festa orientada pela minha irmã. Onze anos. Muita música e muitos jogos. O que nos rimos. Brincámos até de noite. E eu, claro, de roupa nova. Uma camisa de xadrez azul e branca e umas calças de ganga, imitação Uniform, e uns ténis vermelhos, imitação All Star. O pior foi quando descobri as verdadeiras marcas. Deixei de os querer usar. As dores da adolescência!  Mas fazer anos era fazer uma festa. Sempre foram as festas. Em casa. A quatro. Quando os dias calhavam à semana. Ao fim de semana era na garagem cheia de miúdos. Na cozinha com a família. Ou nas férias do Carnaval. Era sempre uma animação juntar as máscaras e as serpentinas ao bolo de aniversário. E as festas foram mudando. Foram idas ao cinema com os amigos. No Amoreiras. Com almoços no Mcdonald's. Aos 18 voltaram a casa. Mas os pais e a irmã deixaram a festa. Deixaram-nos sozinhos. A beber cervejas e a jogar snooker. Foram as saídas à noite e os jantares de grupo. Lanches no salão de chá. Uma despedida em Barcelona com as meninas mais queridas que me fizeram a vontade. Umas tapas em casa. Foram jantares surpresa. E surpresas. E prendas surpresa. Sempre gostei do meu dia de anos. Acho que fui sempre muito mimada nesse dia. Acho difícil não gostar de fazer anos. Sempre foi afeto. Sempre foi festa. Mimo. Sempre foi receber muito. E não me refiro a prendas. Embora goste. E este ano os anos mudaram. Um pouco. Foquei-me um pouco mais noutra festa. A estreia da Alice. Também quero que viva os anos em festa. Acordámos os três. Abraçámo-nos. Mostrámos que fazia um ano com o dedo. E ela repetiu. E aplaudimos a três. Houve sessão de fotos antes de ir para a escola. E na escola levámos um bolo feito pela vizinha Ludovina. Cantámos todos. A sala um e dois. Fizeram-lhe uma coroa. Fizemos um comboio. Tirámos fotografias. Rimos. Enquanto os bebés aprovavam o bolo da vizinha. Caseiro. Calhou a dia da semana. Mas como manda a tradição houve festa de fim de semana. Não foi na garagem. A minha é pequenina. Foi em casa. Com chuva e frio no exterior. Com as batatas fritas a ficarem moles de tanta gente e tanta humidade. Mas foi bom. É para repetir. Mesmo que tenha menos tempo para pensar no meu dia de anos. Porque os preparativos precisam de tempo. Mas mesmo assim, vou sempre gostar de fazer anos. Vou sempre querer festejar. Voltei a ser surpreendida. Pela prenda do marido que tocou à campainha. Pela prenda dos pais que foi deixada de fininho cá em casa. Pelos parabéns ao telefone dos irmãos e sobrinhos que fizeram lembrar as manhãs lá de casa. Pareciam mil. Pelos parabéns cantados pela tia Jacinta. São sempre sorridentes e calmos. Demoram e sabem tão bem. Eu danço do outro lado da linha. Também tive direito a bolo de gomas. E de nutella. Tantos e tantos mimos. E ainda houve jantar de última hora. Tinha de ser. Um convite de véspera. Mas os amigos é assim. Foi tão bom. Acho que não consigo não festejar. Estou mal habituada. Sempre foi assim. Sempre gostei do meu dia de anos. Vou continuar a vivê-lo. Como sempre. Em festa. Com afeto. Mesmo que as festas da Alice me tirem algum tempo.Vou continuar a querer vestir roupa nova. Vou continuar a adormecer cheia de vontade de acordar no meu dia de anos. Sempre foi assim. E vai ser ainda melhor. Quando a Alice me acordar com os Parabéns. E o meu dia passou a terminar da mesma forma que começa. Desejosa que amanheça. Será a minha vez de a acordar. A cantar. A celebrar. Sempre gostei do meu dia de anos. E desconfio que vou gostar cada vez mais. 






Comentários

  1. tão bom, Célia! eu também gosto muito de fazer anos :) que os teus dias sejam sempre cheios de mimo, como mereces e... muito em breve... receberás os melhores presentes de aniversário da Alice :) Aliás... ela já é o teu melhor presente!

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    1. É mesmo o melhor presente!!! Mas estou desejosa de mais. Quando começar com as palavras como o teu "duati" adorei esse vídeo. Beijinho e obrigada por vires sempre até este coração

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