o sorriso do avô Chico

 






















Lembram-se do meu avô Chico? Não aguentou. Fiquei sem ele. Foi no inicio do mês. Acho que ainda não percebi. Acho que ele ainda está onde sempre o encontro. Sentado na cadeira de praia. No alpendre. Ainda o vejo através das grades quando o meu carro pára. Calmo e sereno. Ainda o vejo a olhar para mim enquanto me aproximo. A sorrir. Sempre a sorrir. Ainda o oiço. "Ó Célia!"  Acho que ainda não percebi. Ainda o vejo a pedalar. Ainda o vejo à mesa. Acho que ainda tira a navalha do bolso para almoçar. Acho que ainda limpa o bigode farfalhudo. Como só ele faz. Acho que ainda vamos conversar. E eu gosto de o ouvir. Sábio. Convicto. Moderno. Ainda o vejo independente. Seguro de si. Com personalidade. Ainda o vejo. E ainda bem que o vejo assim. Ainda bem que não o vi nos piores dias. Ainda bem que não encarei o sofrimento. Sei que existiu mas não consigo ter essa imagem. E isso deixa-me feliz. Quero o avô Chico como ele sempre foi para mim. E é assim que ele vive e viverá comigo. Comigo e com todos. Foi tão triste a despedida. Mas ao mesmo tempo foi bonita. Sim, foi bonita. Quando revejo aquela tarde enche-me o coração. Foi bonito sentir este amor entre todos nós. Foi bonita a homenagem que o Vítor conseguiu ler sem chorar. Foi bonito terem falado de cada um dos netos e bisnetos. E somos muitos. Vinte e seis. Foi bonito ver que desde o neto mais velho até as bisnetas mais velhas todos sentem o mesmo. Desde os quarenta aos catorze todos sentem o mesmo. Foi bonito ver o amor daqueles que se tornaram netos de coração. Apesar de tudo, foi bonito! O avô Chico era especial. É especial. E isso sentiu-se na despedida. Filhos e netos e bisnetos. Estivemos todos agarrados. Eu acredito que ele viu. Viu com aquele sorriso. Aquele sorriso que está sempre na minha memória. Aquele sorriso com que pegou na Alice ao colo. Ele veio vê-la. (Obrigada tia Lurdes e tio Jaime). Aquele sorriso com que me disse "ó Célia, tu nem com uma filha ficas com corpo de mulher." Nesse dia demos o último abraço. Mas sabem, acho que ainda não percebi. Acho que ele ainda está naquela cadeira frente à garagem e se levanta para me abraçar. Vou achar isso até lá voltar. E quando vir a cadeira vazia vou lembrar-me do meu avô Chico a sorrir. Vou sempre ter muito orgulho em ser abelheira. Vou sempre sorrir quando pensar nele. E sabem, vou guardar as histórias do avô Chico. E um dia vou oferecê-las à Alice. Ela vai sorrir!

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