o tempo do Natal

Parece que estou a acordar agora. Sinto-me de ressaca. A tentar acalmar. A tentar aproveitar os dois dias que me restam até começarem os festejos novamente. Foram dias intensos. Onde o tempo corre atrás de nós. É o trabalho que se anda a multiplicar. São as festas. Os aniversários. As festas da escola. Os teatrinhos e as feiras de Natal. Os encontros com os amigos. Os jantares e almoços. São os presentes. Dos aniversariantes. Dos amigos secretos. Das crianças. Do marido e da filha. Uma lista para pensar. Criar. E comprar. Uma casa que se tem de preparar para receber. Uma sala para remontar porque têm de caber todos. E queremos todos minimamente confortáveis. É decidir e organizar quem traz o quê. São as compras do bacalhau e do polvo. Do pão e da broa no mercado logo pela manhã. É começar a cozer ainda antes do almoço. É dividir tarefas entre os dois. E pelo meio entreter uma criança. São as compras de última hora. Os embrulhos no último minuto. São as chamadas que ficam por fazer e atender. As mensagens adiadas. É ter tudo pronto a horas. É vestir a Alice já com os convidados a chegar. É respirar. Sentir que estamos todos. Servir. Ver todos sentados. A comer. É respirar e começar a aproveitar. Conversar. Brindar. Rir. Brincar e jogar. Nesse momento o tempo parece que dura mais. Já estamos todos. Já nada está por fazer. Apesar de haver sempre uma mesa para repor. Uma loiça para lavar. Uma ementa para cumprir. Mas já se respira. As crianças correm pela casa. De dois em dois minutos a Alice pergunta se pode dar os presentes aos primos. Aos tios. Aos avós. E vamos adiando até não conseguir mais. E lá se vão abrindo os embrulhos. Pela ordem que ela pede. Porque as crianças não aguentam. E nós também não. E lá vamos dando e recebendo. Devagarinho. Com carinho para aproveitar cada presente. E é assim até tarde. E no dia seguinte repete-se. E começa mais cedo. Ao inicio da tarde. Substituem-se alguns convidados. Mas a casa enche na mesma. Repetem-se os procedimentos. Voltamos a estar juntos à mesa. Voltamos a conversar. A rir. A jogar. Voltamos a dar e receber. Até à hora de jantar. E terminamos todos juntos e colados no sofá. Uns não cabem mas arranjam espaço. Estamos perto. E mesmo sem desembrulhar... continuamos a dar e receber. E é assim o Natal. O mês de Dezembro. Que maravilha. Que intensidade. Que velocidade. Que ressaca. E a culpa é nossa que queremos cumprir e incluir tudo neste tempo que temos. Neste tempo que quando somos crianças parece não terminar. E que à medida que vamos crescendo não pára de acelerar. Mas ele mantém sempre a mesma cadência. O tempo não muda. Não vai mudar. E nós sabemos disso. Mas insistimos. Porque vamos conseguindo incluir tudo. Quase tudo. Há coisas que ficam por fazer. E neste tempo de Natal em que muitos dos meus presentes foram as minhas palavras, não consegui desejar, falar, escrever "Feliz Natal" a uma série de pessoas. Faltou-me isso. E isso deixa-me um vazio. Estamos a deixar de falar, de escrever, de nos dedicar aos outros. Bastam-nos as fotos de família no Insta e no facebook. Aquelas em que vestimos as crianças de xadrez. Em que colocamos adereços natalícios. Em que sorrimos felizes para a câmara do smartphone. E depois esperamos que os corações ganhem cor... likes e comentários. E parece que ficamos felizes. Mas eu preciso de mais. Preciso de ganhar tempo a falar e a escrever aos outros. Preciso de dar e receber conversas e desejos personalizados de natal. 
photo by Bodil Jane 



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