acho que atingi a respiração ideal






















Não sei se vou conseguir explicar. Não sei se alguém irá entender. Se alguma vez alguém se sentiu assim. Mas tenho uma sensação como nunca tive. É um sorriso interno. Uma paz que se prolonga suavemente. Uma espécie de bem estar. Talvez a felicidade. Não sei. É apaziguador. É tranquilo. É discretamente bom. Parece que me sabe bem respirar. Ouvir. Sentir a respiração. Ouvir-me. Porque está tudo igual. Bem. Mas para melhor. Parece conversa de loucos. Talvez seja. Mas hoje (sábado) fiquei só com Alice. O pai foi ao Benfica-Porto. Saiu cedo de casa. Tipo final da Taça no Jamor mas sem o garrafão de vinho, sem o piquenique, sem a família e os amigos. Apenas com o cartão de sócio e com o cartão do cidadão porque a antecipação do jogo prometia filas e ruas cortadas e segurança apertada. E nós as duas regressámos de casa dos avós e da companhia dos tios e dos primos. A Alice estava febril. Preferi vir para casa. Como tantas outras vezes. Mas desta foi diferente. Estivemos tão bem. E costumamos estar bem. Mas houve cumplicidade. Mais do que o costume. Senti-a crescida. Conversámos. Ajudámo-nos. Divertimo-nos. Fomos cúmplices. E na hora de deitar a febre continuava a querer aparecer.  38.2 e a Alice cheia de energia. Disse-lhe que ia pôr o paninho na testa, tal como se fosse gelo. E tal como lhe fazia quando era bebé.  E ali ficámos. As duas. Eu a segurar o paninho. Ela a fazer-me festinhas. As nossas caras muitos próximas. O nosso olhar muito coeso. E cantámos. E rimos. E brincámos. E senti sempre um olhar apaixonado. Não sei se me sentiu a cuidar dela. Mas os olhos dela disseram-me isso. Não sei se me mentiram. Se vi coisas onde não existiram. Mas os olhos sorriam e pareciam apaixonados. E ali ficámos até chegar aos 37.05. Fomos para a cama. Escolheu a história da Girafa e do Pinguim. E na hora de ir apagar a luz... Fiquei com uma dor. Daquelas que nos congelam. Que não nos deixam mexer. Foi no ombro. Com certeza foi consequência da minha posição. Tal como a mãe girafa faço malabarismo com o meu corpo para estar na cama com a Alice na hora de adormecer. E o meu pescoço é muito mais pequenino. Ao sentir a dor pedi à Alice que esperasse. Fechei os olhos. E não mexi. E quando os abri senti que ela estava meio atenta. Meio preocupada. E sorri. E disse que já tinha passado. E lá ficamos às escuras. Beijo de boa noite. Seguiram-se os rituais habituais. E sinto uma mão nas minhas costas. Que me faz festinhas. Que me aperta. É a Alice que cuida. Como eu cuidei dela. Pergunta se a dor já passou. Tremo de felicidade. Digo que sim. Ela continua a fazer-me festinhas nas costas. Digo que é uma querida. Ela continua a apertar-me as costas. Agradeço-lhe. E a mão continua. Meiga. Para cima e para baixo. Apertadinha. E quando sai continuo a cantar. Para ela dormir. E ela adormece. E eu penso. Em muita coisa. A minha cabeça não pára. Já estou noutros momentos. Mas regresso. Quando saio do quarto. Quando respiro. Quando me apetece respirar. Porque é bom. Nunca senti. Parece que senti pela primeira vez que me ama verdadeiramente. Que me admira. Não sei explicar. Nem sei entender. Sei que sempre gostou de mim. Sei que às vezes diz que sou a Célia querida. Sei que me dá beijos e mimos. Sei que me abraça. Mas hoje senti mais. Suavemente mais. Sinto que respiro e que suavemente o coração aumenta... sem aumentar o ritmo cardíaco. Parece que atingi aquela respiração ideal. O batimento certo. Aquele que não nos preocupa. Que nos descontrai. Que no diz: É isto! Por mim... o coração podia entrar em loop. 

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